4ª aula do Curso Educação Ambienta de Base Comunitária e Ecologia Política na América Latina.
Professor Dr. Renato Noguera (UFRRJ) – 04 de agosto de 2018
Resenha feita por Cândido Rafael
Alessandra Nzinga, pesquisadora e mestranda do GEASur começou a apresentação da 4ª aula do curso, falando sobre a sua pesquisa de mestrado, Educação Ambiental que emerge dos terreiros de candomblé, e a importância para a Educação Ambiental de Base Comunitária e, posteriormente, fez uma breve apresentação do Professor Dr. Renato Nogueira, do departamento de Filosifia da UFRRJ e da pesquisadora e doutoranda Katiuscia Ribeiro da UFRJ.
A primeira parte da aula do dia foi proferida pelo Prof Dr. Renato Noguera. Como uma breve apresentação de suas obras para os discentes e uma breve reflexão sobre a generalidade do seu trabalho acerca da Filosofia Negra e o Pensamento Africano e Afrobrasileiro.
A aula iniciou a partir da reflexão dos conceitos de Pedagogia Pluriversal e as Práticas Ambientais Comunitárias. Conceitos que foram provocados no público através de uma visão cósmica do Universo em contrapondo ao pluriverso. Situando o público no espaço/tempo das correntes e pensamentos ocidentais e orientais.
Após a abordagem teórica inicial, o professor iniciou uma provocação filosófica sobre os vocábulos Cosmovisão e Cosmosentidos. Relacionando o primeiro à questão da percepção de mundo pelo sentido da visão e os Cosmosentidos pela maneira de ver o mundo que não seja somente pela visão, mas sim os outros sentidos como o paladar, olfato, tato e audição.
Diante dessa necessidade de plurissentir o mundo, a narrativa do docente transitou entre a diferença do ao de Estudar e o de Aprender. Estudar algo relacionado ao ofício, aprender algo relacionado à parte lúdica da vida. Estudar, muitas vezes, representa a ordem do interesse de pesquisar, de compreender o funcionamento do mundo pelo prazer.
A partir da problematização do conceito de estudar e aprender, o docente questionou a abordagem do ensino por competência e habilidades, pois coloca numa “régua mensurável” uma separação dos alunos por uma nota. Separação extremamente perigosa do que chamam popularmente de “joio e do trigo”. Logo, o vocábulo “Aprender” dá a ideia de que o outro está desconectado de nós, pois se tem a ideia de que somos o centro do universo.
A partir do esvaziamento linguístico do vocábulo africano Ubuntu, somos todos/nós somos, no sentido de que há uma unidade, dificulta reconhecer que as sociedades não são iguais e isso é importante, pois é necessário a diversidade das comunidades. Nossa organização social é interessante por que os grupos podem buscar um objetivo comum, porém torna paradoxal. Porque precisamos enfrentar os atritos, debates, conflitos para crescermos em comunidades.
Sobre as religiões, o docente abordou a questão das visões teológicas das Religiões abraâmicas, que surgiram da narrativa bíblica de Abraão, o islamismo, o judaísmo e o cristianismo. Essas religiões se alimentam da ideia de tribos eleitas e, portanto, entraram no imaginário burguês contemporâneo. A pedagogia hegemônica, ou seja, dominante quer chegar a uma utopia de que chegaremos ao ponto do futuro para o sucesso, como uma espécie de salvação.
Ainda sobre as religiões e a psicologia, autores africanos revisitaram a psicologia e a psicanálise ocidental e encontraram uma relação fascista que mantem uma posição controladora do ambiente, pois foi dado a Adão o direito de nomear e controlar a criação. Nas religiões abraâmicas, o ser humano é, portanto, o centro gravitacional do universo.
A partir do conceito de que não somos o centro do universo, o docente cita a obra de Davi Kopenawa e Bruce Albert, “A QUEDA DO CÉU: Palavras de um xamã yanomami”, na qual diz que os seres humanos não são seres depois dos animais e os animais não são seres que vieram depois dos humanos. Aborda também a questão espiritual da relação entre o colonizador: “Os astecas têm almas?” e o colonizado “Os espanhóis têm corpo?”.
É a partir dessa abordagem da decolonialidade que a aula caminhou para o sentido de que algumas sociedades não se organizaram para ser coloniais/colonizadoras. Nesse ponto, a antropóloga Guarani e doutoranda Sandra Benites e Antônio Bispo servem para inspiração de como compor práticas e pensamentos distintos de maneira decolonial. Pois a maneira como se pensa os gêneros nas sociedades indígenas e africanas podem nos fazer refletir sobre o conceito de hegemonia.
Levando em consideração o pensamento decolonial, o trabalho não é a expressão máxima humana como afirmava Marx, não é uma tarefa que revela o humano. É a maneira como o ser-humano interage com a realidade. A noção do trabalho com o meio-ambiente muda com a nossa percepção da tese da centralidade do trabalho. A relação humana pode ser livre de impostos nas organizações tradicionais, pois não se organizam pelo relógio, mas de acordo com os indicadores da natureza. Por isso, a Europa via os americanos e africanos como não pensadores, preguiçosos por que não organizam seus trabalhos como os ocidentais faziam.
O tempo na perspectiva oriental, portanto, é sentido de maneira diferente. Na sociedade tonga, por exemplo não se escondia a idade, pois, para esse povo, “Isso é uma tentativa de mascarar a experiência da vida.”
A sociedade se baseia, portanto, na visão de mundo. Ela se relaciona primeiro na visão e não nos outros sentidos. Essa é a maior diferença entre a visão e os outros sentidos como olfato, tato, paladar. O marxismo e a bíblia, portanto, nesse sentido, têm muitas coisas em comum, pois partem no principio do trabalho, da visão e da perfeição. Tem-se no trabalho uma penalidade, no pecado original de Adão e Eva.
A tradição moderna opera dentro do espectro de visão de mundo. Para que possamos sair dessa visão, deveríamos abandonar o trabalho no seu sentido judaico/cristão/marxista. Não trabalhar o tempo todo, mas quando se tem necessidade, não com o intuito de acumular o capital.
Precisamos mudar a forma como sentimos as coisas. Da onisciência para a pluriversalidade, da religiosidade para a espiritualidade.
A política bipartidária funciona da maneira de se fazer conversão. Um lado voltado para o mercado e outro para a comunidade. Igualdade x liberdade. Esquerda x direita. Democratas e republicanos. Estrela vermelha e tucano, azul e vermelho. Esquerda e direita. Talvez seja possível fazer política de outra maneira. Pois caímos num esquema pré-montado do jogo político. Precisamos pensar em outras formas de pensar no jogo politico e da educação. A tradição não responde todas as coisas. Precisamos entender, portanto, como as sociedades se organizam. Os yanomamis, guaranis, tongas.
Já, no campo da Educação Ambiental devemos abandonar a Ideia hegemônica de avanço, crescimento, progresso. Isso pode se tornar um totalitarismo. Precisamos voltar a ser crianças. Os três erres, reciclar, reutilizar e retornar, não vai solucionar o problema ambiental. Muitas vezes, desenvolver-se pode gerar muitos problemas. Precisamos, por isso, pensar outras maneiras de gerar energia.
É necessário também refletir que “Nem tudo que se ajunta, se mistura. Nem tudo que se mistura, se ajunta.” Conforme afirma Antônio Bispo dos Santos. Precisamos abandonar a ideia do biointeracionismo entre o sintético x orgânico numa sociedade moderna que diz ser o sintético é mais importante do que orgânico.
Depois de muitas provocações, o docente abriu a aula para a participação dos alunos e deixou a seguinte mensagem: “Devemos incorporar novos hábitos e essa incorporação não vem pelo aprendizado, mas sim pelo estudo.”